quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Vinte vereadores não têm o direito de legalizar o ilegal


O espaço público porto-alegrense ficou menor, a partir de ontem

Ontem, na Câmara Municipal de Porto Alegre – das tantas instituições suspeitas, neste País e neste Estado – um dos vereadores, precisamente um que se intitula “Doutor” (não cito o seu nome para não emporcalhar os olhos de quem lê esse blog), saiu-se com a seguinte sentença:

- O projeto Pontal do Estaleiro não é magnífico, é mais que magnífico, é magnânimo!

Magnânimo para quem, senhor representante da privataria do solo urbano de Porto Alegre? Para quem?

O ato falho do “Doutor” revela quase tudo do que está nas sombras e dobras da votação de ontem que aprovou por maioria de 20 a 14 a construção de um condomínio privado na Ponta do Melo, antiga sede do falido Estaleiro Só.

A área de seis hectares (60 mil m2) foi adquirida em leilão no ano de 2005 por investidores privados. Agora, esses especuladores imobiliários querem realizar o seu capital, pretendendo construir seis torres edificadas, quatro residenciais e duas comerciais. Ocorre que a atual legislação municipal veda a edificação de projetos como esse. A aprovação legislativa de ontem não pode legalizar o ilegal, a vontade de vinte vereadores não pode se sobrepor ao Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental, muito menos impor à cidade um empreendimento com objetivos puramente comerciais, que desrespeita o direito da cidadania em favor da força econômica do capital especulativo do solo urbano.

O embate legislativo de ontem é simbólico do que está por acontecer em Porto Alegre, nos próximos anos. A indústria da construção civil está represada há mais de 25 anos no Brasil, mas vem dando sinais de reação nos últimos três anos, estimulada por iniciativas desenvolvimentistas do PAC, por pressão de demanda e pelas perspectivas negociais propiciadas pelo advento da copa mundial de futebol em 2014. Com a crise mundial do capitalismo e a virtualidade do travamento recessivo iminente, a retomada dos investimentos imobiliários no País ficam condicionados à capacidade do governo federal de reagir às adversidades globais.

De qualquer forma, a corrida frenética por posições vantajosas na ocupação territorial das cidades está em franco andamento. Esse fenômeno pode ser descrito como uma corrida do ouro ou febre do solo urbano, onde poucos querem ganhar muito, e aproveitar as vantagens que pingam dos movimentos do capital em busca de realização de lucros.

Neste sentido, vereadores oriundos de classes humildes, semi-alfabetizados, toscamente politizados e turbinados por imaginários fantasiosos de ascensão social aos truques – nem sempre pautados pela ética - tornam-se presas fáceis de investidores inescrupulosos.

De resto, o que está posto hoje em Porto Alegre, e em todas as cidades brasileiras que experimentam processos similares, é o seguinte: todo e qualquer incremento de desenvolvimento local – mantidas as correlações sociais vigentes – implica uma transferência de riqueza e chances de vida, da população em geral para os grupos rentistas e seus associados.

Ontem, os vinte nobres edis adeptos do urbanismo de resultados promoveram um encolhimento (ilegal) do espaço público na cidade. Em nome do quê, mesmo?

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